Um estranho detalhe na Bíblia
0Hoje eu queria fazer uma coisa diferente, que é só compartilhar com vocês de uma forma bem espontânea assim uma reflexão que eu tava tendo a partir de algumas leituras sobre os evangelhos, sobre Jesus histórico e sobre o mundo romano, né? A cultura, a história contextual ali que lança luz sobre algumas passagens ali da Bíblia. E eu vou fazer isso então de uma forma emendando uma coisa na outra aqui. Mas detalhe curioso sobre os evangelhos a partir de algumas leituras que vão da antiga Suméria, mundo judaico, romano, Marco Aurélio Imperador e a tradução da Bíblia do Frederico Lourenço. Eu tava lendo esse livro aqui, que é a Bíblia. Novo Testamento, os quatro evangelhos, que são os quatro evangelhos mesmo, só que traduzidos pelo Frederico Lourenço a partir do grego. Muita gente me pergunta sobre essa tradução, porque é uma tradução não denominacional, né? Não é feita a partir de uma demanda confessional de igreja, de culto. É um acadêmico, um erudito fazendo uma tradução a partir do grego, da mesma forma que ele fez a tradução da Odisseia, por exemplo, da Ilída e de outros textos clássicos. Então ele pegou a Bíblia grega e foi fazendo a tradução aos poucos. Esse é o primeiro volume. Ele começa pelos quatro evangelhos, mas tem já tem publicado acho que uns oito, né? Aí eu comecei a ler para para ver se eu achava interessante para falar, para responder essa pergunta, se eu gostei ou não da tradução, como vocês perguntam muitas vezes. E aí eu tava aqui na eh nas notas iniciais em introdução aos quatro evangelhos e ele faz um comentário que é de que existe um tema que é muito importante nos evangelhos, mas em um dos evangelhos está completamente ausente, que é o tema do exorcismo, que aparece de forma muito importante em Mateus, Marcos e Lucas, mas está completamente ausente de João e do resto do Novo Testamento também, mas pegando em termos de evangelhos, né, que são essas biografias de Jesus no sentido antigo, a gente não encontra nenhum relato, nenhuma cena de exorcismo no Evangelho de João. E aí ele ele coloca uma uma sugestão que não é original dele, mas ele coloca aqui em nota que isso pode ter um motivo específico relacionado a uma certa característica cultural ali do mundo romano. Só que antes de falar qual que é exatamente essa resposta, deixa eu só enfatizar essa importância dos exorcismos, do da questão do exorcismo nos evangelhos e no mundo antigo de forma geral. Porque passando para outro livro que também são os quatro evangelhos, sinopse dos quatro evangelhos, né? Isso aqui é um tipo de edição de que coloca os quatro evangelhos em colunas para que você possa fazer a leitura de passagens similares, uma do lado da outra, para perceber ali as particularidades de cada uma, como é que cada evangelista narra um evento semelhante, né? às vezes com diferença. Às vezes às vezes se encontra a mesma, mais ou menos a mesma coisa nos quatro evangelhos, mas é mais raro. Geralmente você encontra mais as colunas dos sinóticos, que são os três, Mateus, Marcos e Lucas, preenchido, e a de João em branco, porque o evangelho de João é muito diferente, né? E aí quando você pega uma edição dessas, você vai encontrar frequentemente na nas histórias de exorcismo isso que são as três colunas de dos sinóticos preenchidas e a de João ausente. E isso acontece mais ou menos umas cinco ou seis vezes, porque tem mais ou menos cinco ou seis, depende como que você conta, cinco ou seis histórias diferentes de exorcismo que perpassam ali e se repetem eh nos evangelhos, né? Para dar um exemplo, tem a história de exorcismo do endemoniado de Gadara, que no Evangelho de Mateus é Gadara, no Evangelho de Marcos e Lucas é Gerasa, né, que é outra região. Eu vou ler a a versão em Mateus aqui que é mais curtinha, que diz o seguinte, né? Ao chegar ao outro lado, a região dos gadarenos, vieram ao seu encontro dois endemoniados saindo dos túmulos. Eram tão ferozes que ninguém podia passar por aquele caminho. E eis que puseram a gritar: “Que quereis de nós, filho de Deus? Vieste aqui para nos atormentar antes do tempo? Ora, a certa distância deles havia uma manada de porcos que estava pastando. Os demônios lhe imploravam, dizendo: “Se nos expulsas, manda-nos para manada de porcos”. E Jesus disse: “Ide”. Ele saindo, então, os demônios saindo do corpo ali dos dois gadarenos, foram para os porcos e logo toda a manada se precipitou no mar, do alto de um precipício, e pereceu nas águas. Os que apacentavam aquela manada de porcos fugiram e dirigindo-se à cidade contaram tudo o que acontecera, inclusive o caso dos endemoniados. Diante disso, a cidade inteira saiu ao encontro de Jesus e ao vê-lo, rogaram-lhe que se retirasse do seu território. Então aqui tem essa história de que Jesus aparece ali em Gadara e expulsa demônios de do de duas figuras ali, que são os gadarenos, né? E aí tem várias outras histórias, como por exemplo também a história de um menino possesso. Na verdade, não é essa que eu quero. Poderia ser essa também, mas eu quero a história em que há uma controvérsia se Jesus expulsa demônios pelo poder de Deus ou pelo poder do diabo. É, isso aparece, por exemplo, em Mateus 12 22 a 29. Então, também aparece nos três evangelhos, não aparece em João. E diz o seguinte: “Então, trouxeram-lhe um endemoniado cego e mudo, e ele o curou, de modo que o mudo podia falar e ver. Toda a multidão ficou espantada e pôs-se a dizer: “Não será este o filho de Davi?” Mas os fariseus, ouvindo isso, disseram: “Ele não expulsa demônios senão por Beusebu, príncipe dos demônios”. Então, diante dos atos ali de Jesus, né, fazendo o exorcismo, alguns da multidão consideravam que aquilo era um sinal de que ele era o Messias, filho de Davi, e outros consideravam que aquilo era um sinal de que ele, pelo poder do príncipe dos demônios, expulsava demônios. Então, com a autoridade do chefe dos demônios, ele ele expulsava demônios, né? Então, começa essa controvérsia. E aí, conhecendo seus pensamentos, Jesus lhes disse: “Todo reino dividido contra si mesmo acaba em ruína, e nenhuma cidade ou casa dividida contra si mesmo poderá subsistir. Ora, se Satanás expulsa Satanás, está dividido contra si mesmo. Como então poderá subsistir seu reino? Se eu expulso os demônios por Beusebu, por quem os expulsam os vossos adeptos? Por isso eles mesmos serão os vossos juízes. Mas se é pelo Espírito de Deus que eu expulso os demônios, então o reino de Deus já chegou a vós. Isso é muito importante. Então Jesus tá dizendo o seguinte, que se é pelo Espírito de Deus que ele expulsa demônios, então já chegou o reino de Deus. Então o exorcismo aparece como um sinal de messianismo paraa parte ali da da multidão e aparece explicitamente da boca de Jesus como um sinal da vinda do reino de Deus. Então, o exorcismo, essa prática específica, tem um grande peso nas histórias dos evangelhos, né? Mas de novo, isso não aparece nenhum exorcismo no Evangelho de João, né? Por que que será que esse é o caso? E outra coisa, duas coisas que a gente pode perceber por essa passagem, né? A primeira é essa que eu falei, que o exorcismo aparece como um sinal muitas vezes de poder, de autoridade divina. E também outra coisa que aparece aqui é que outras pessoas faziam exorcismos também. O exorcismo não é uma prática exclusiva de Jesus e dos seguidores de Jesus, já que a multidão ou pelo menos os fariseus cogitam ali que pode ser pelo poder do chefe dos demônios aquele expulsava demônios. Então pode ser que tenha outras pessoas que pelo poder, por poderes demoníacos expulsem demônios. Então, já era uma prática conhecida nos tempos de Jesus e muito antes. Só que para pegar o judo no judaísmo, vou pegar outro livro aqui que é o Jesus e o mundo do judaísmo para citar um exemplo de exorcista galileu do primeiro século que não era Jesus, que era um rabino chamado Ranina Bendossa. Então é no Talmuds, né, que é uma coleção de textos importantíssima pro judaísmo rabínico, eles falam sobre essa figura do primeiro século, que é o Hanina Bendos. E tem um texto, né, no Talmud que diz o seguinte: aconteceu de quando o filho de Raban Gamaliel adoeceu, este enviar dois dos seus pupilos a Ranina Bendosa, para que este rezasse, né, ou orasse sobre eles. Quando os viu, Hanina dirigiu-se ao quarto superior e rezou. Quando desceu, disse-lhes ele: “Vão, pois a febre o deixou”. Então, duas pessoas procuram o Hanina Bendça para acudir ali o filho de uma pessoa importante da comunidade. E o Hanina vai, faz uma oração e diz: “A febre o deixou”. E aí o pessoal diz para ele, né? “És um profeta?” Pergunta pro pro Hanina. E ele respondeu: “Não sou profeta, nem filho de profeta, mas tenho a minha bênção. Se a minha oração for fluente na minha boca, sei que o homem doente será favorecido. Se não, sei que a doença é fatal”. Eles se sentaram, escreveram e anotaram a hora em que isso aconteceu. E quando voltaram ao Gamaliel, este lhes disse: “Céus, vocês nada tiraram nem acrescentaram, mas foi assim que aconteceu. Foi nessa hora que a febre o deixou e ele nos pediu água para beber”. Então o Hanina, por meio dessa oração, cura o menino, né? Aqui no caso não tá o o a cena não é especificamente de exorcismo, né? Mas é uma um tipo de prática também de cura. E eu vou relacionar a questão do exorcismo com cura já também, que era muito presente no imaginário, né, na forma de ver o mundo do judaísmo do primeiro século e não só do judaísmo. Porque passando para outro livro que é esse, no começo eram os deuses, né, a gente pode ver que exorcismo era uma prática que a gente conhece desde do terceiro pro segundo milênio antes de Cristo. Eh, na documentação suméria, nos textos sumérios, nos textos também acádios, né, na Mesopotâmia, a gente já tem registros de exorcismo, de fórmulas de exorcismo e de histórias de exorcistas, de pessoas que expulsavam demônios, expulsavam espíritos, que tinham eram chamados por outros nomes, né, mas expulsavam seres, agentes invisíveis para curar doenças. Então, por exemplo, tem um capítulo dedicado a isso nesse livro, né, é chamado A magia medicina reinou na Babilônia. Eu já fiz um vídeo inclusive no canal sobre essa questão da medicina e magia na Babilônia e um texto lá do segundo milênio antes de Cristo diz: “A doença, né, a de mito subiu do inferno do Curnugu, da terra sem retorno, do inferno mesopotâmico e os demônios, entre aspas, né, os Étemu, como se chamava em Acádio e Guidim, no sumério, mas enfim, a doença subiu do vou colocar os termos mais no na forma como a gente conhece, né? A doença subiu do inferno e os demônios que a traziam, encontrando este paciente abandonado por seu deus protetor, que ele havia ofendido, envolveram-no com ela como com um manto. Ou seja, o cara negligenciou os cultos, ele não agiu corretamente para com o seu deus protetor e aí ele perdeu essa proteção. E esses agentes invisíveis, causadores de doenças, aproveitaram essa ocasião para se apoderar, para possuir esse camarada. né? Então, esse é um texto mesopotâmico do segundo milênio antes de Cristo, antes de Cristo e antes até do judaísmo, né? E também tem outra passagem que fala, né, que que é um rito, uma fórmula de exorcismo, uma forma de uma uma série de palavras próprias para ser recitada, que diz que a divina curadora Gula, que é uma deusa, capaz de devolver a vida aos moribundos, o restabeleça por meio do toque de sua mão. E você, compassivo Marduk, para que ele fique completamente fora de perigo, pronunciará a fórmula que o libertará de sua aflição. Aí tem vários exemplos de textos que eh ligam essa questão de ação divina para expulsar demônios e resolver condições do corpo, como a gente encontra também muitas vezes nos Evangelhos, o caso da cura, do exorcismo, que cura a um mudo ou a surdez também, que cura eh a pessoa se debatendo no chão, como no caso dos gadarenos, né, que se jogavam no chão, que pulavam no fogo na água. em outra história também fala algo nesse sentido. Tem então várias questões corporais, a morte, né, em último caso, causada por uma possessão demoníaca. tudo isso poderia ser causado, poderia ser resolvido por meio de um ritual de exorcismo. Então isso é uma ideia muito presente, não só no contexto de Jesus, mas depois e antes, em várias regiões do mundo. Eh, a gente poderia pegar eh as as kitsunes, eu não sei como é que a pronúncia tá, mas é kids que escreve no Japão, que são raposas fantasma, basicamente que possuem mulheres e levam mulheres à loucura. Tem osocais também, né, na no Japão. E você tem praticamente todas as culturas essa ideia de seres invisíveis que entram no corpo da pessoa ou cobrem o corpo da pessoa e causam efeitos negativos, tanto de alucinação quanto de a a problemas na pele e qualquer tipo de do que hoje a gente considera como patologias ou coisas do tipo. Beleza? Então, esse é o o primeiro ponto. Exorcismo era uma prática amplamente eh realizada em vários locais e em vários momentos da história. E mais especificamente, a gente aqui a gente começa a voltar pra desculpa para falar sobre tudo isso, que é o o detalhe lá de que o evangelho de João não fala sobre exorcismo nenhum, que é que no mundo romano a gente também tem, e esse é o ponto que o Frederico Lourenço me chamou atenção na nota, eh no mundo romano a gente tem relatos de intelectuais, pessoa dos meios, pessoas dos meios mais educados, né, por assim dizer, mais eh pessoas que que tiveram tutores, cultivaram a filosofia, a educação formal, que repudiavam a prática do exorcismo como uma crendice, como algo eh das massas, né, como uma coisa mais do povão. Então o o Frederico Lourenço na nota ele cita e foi ouro aqui essas citações, né? E aí eu fui atrás de cada uma delas, mas ele coloca que Marco Aurélio diz isso e Plotino diz isso e coloca aqui Marco Aurélio diz isso nas meditações e Plotino diz isso nas enéidas, né? e coloca aqui o a nota para ficar mais fácil encontrar. E eu fui atrás, então, e nas meditações de Marco Aurélio, Marco Aurélio foi o imperador romano do primeiro século e era um filósofo, né? era um apreciador da do saber, um amigo do saber eh histórico. E ele na logo no inicinho do livro, no primeiro livro das meditações, ele começa a falar sobre pessoas que foram importantes para para sua formação. Ele fala do avô dele, do pai, da mãe e fala o que que ele aprendeu com cada um deles. E ele cita um cara chamado Diogneto, que não não tem uma que eu saiba, não tem, não se sabe quem é exatamente essa figura, talvez um tutor, mas ele diz aqui com Diogneto, aprendi a não me dedicar a afazeres inúteis, a ser incrédulo em relação ao que dizem os milagreiros e feiticeiros sobre encantamentos e incrédulo em relação aos exorcistas de espíritos e afins, a não apostar em rinhas de galos. nem me entusiasmar com atividades dessa natureza e por aí vai, né? Então ele coloca de galo aí também. Mas o que importa mais para nós aqui é que ele aprendeu, Marco Aurélio diz ser aprendido com a figura de autoridade intelectual para ele, eh, e moral também, né? e moral, eh, a não acreditar em exorcistas de espírito. Então, a gente vê uma figura da mais alta elite romana, ah, colocando a desconfiança em relação aos exorcismos como uma marca distinta de conhecimento, de sabedoria, né? E no caso do Plotino, eu não tenho as enéedas aqui impresso, então eu peguei uma versão aqui online e fiz uma tradução. O Plotino é do é um filósofo do terceiro século depois de Cristo, um filósofo platônico, né? Se quiser chamar de neoplatônico pode ser também. Acho que ele preferiria ser chamado de platônico, mas ele diz o seguinte, eh, isso tá numa parte da das enéadas que ele tá falando contra os gnósticos, então contra esse grupo que não dá para saber exatamente também quem que Plotino tá chamando de gnósticos, mas podem ser cristãos, pode não ser exatamente cristãos, mas gnósticos. E ele diz o seguinte, que os gnósticos assumem que as doenças são daimones, que é um termo no grego que era utilizado para forças, potências que são meio que intermediárias entre os humanos e os deuses propriamente, né, e os imortais. Então, os daimôies eh poderiam ser forças que regem alguma região celestial, que influenciam alguma região terrestre mesmo, né? Eh, por exemplo, daimônias, tipo das florestas, alguma coisa desse tipo, podem ser figuras eh que cuidam pessoalmente de um indivíduo. Então, você nasce e um diamone ou um diamon, melhor dizendo, o singular é é apontado para cuidar de você do momento da sua do seu nascimento, ao momento da sua morte. Então, são figuras assim, eh, poderes sobrehumanos, mas que não são propriamente deuses, né? E é desse nome que vem o o nosso termo demônio em português. Só que o nosso termo demônio, ele chega no português a partir já dessa influência cristã especificamente, em que os demônios são exclusivamente negativos, são seres que causam o mal. Enquanto que os daimônias gregos eh e no mundo romano greco-romano, de uma forma geral, néicultura greco-romana, eram seres que eh poderiam ser causar tanta tanto questões positivas quanto negativas, né? eram bons ou maus, eram favoráveis ou desfavoráveis. E aí, voltando pro Plotino, né, o Plotino diz que eh os gnósticos assumem que as doenças são daimôneas e alegam poder exorcizá-las com palavras. Então, os gnósticos teriam essa reivindicação de ter poder sobre as doenças por meio desse método que é expulsar o agente invisível causador da doença, o agente pessoal, né, intencionado, mal intencionado, que é o diamond. E ao fazer tal informação, afirmação, eh eles acabam produzindo a aparência de serem mais santos do que os outros. e as massas ficam fascinadas com os poderes desses encantadores. Então ele tá fazendo uma crítica aqui, tanto filosófica, porque ele depois ele segue nessa sessão fazendo uma crítica filosófica lógica, eh dizendo que é impossível que as doenças sejam causadas por daimôneas. Eh, mas ele faz essa crítica também meio que moral, né, de que os gnósticos estariam usando isso para atrair as massas, passinando essa essas pessoas com essa esse suposto poder que na verdade eles não têm. E aí ele segue, né? Contudo, aqueles que consideram o assunto com cuidado não se deixarão enganar, acreditando que as doenças tenham qualquer outra causa, além do esgotamento, do excesso, da deficiência de alimento, da decomposição, enfim, de processos que se originam no corpo ou fora dele. Então ele coloca aqui uma explicação mais materialista, por assim dizer, da origem das doenças, né? as moléstias do corpo são causadas não por esses daimônias, mas por questões de decomposição e faltas em geral, né? Esgotamento ou excesso também deficiência de alimento e por aí vai. E ele diz: “E o tratamento das doenças comprova isso, pois a doença é eliminada do corpo quando o estômago é esvaziado ou quando um remédio é administrado. E o mesmo ocorre quando se retira sangue, tá? Se referindo à sangria, né? o método médico antigo ou se jeja, o jejum também curou pacientes. Então ele diz que essas são eh curas próprias para doenças e não o exorcismo. Então é interessante que a gente tem esse outro exemplo. Então, no mundo romano, próximo ali do ambiente em que Jesus viveu e que os evangelhos circularam, de pessoas mais da elite intelectual, fazendo uma crítica desse eh dessa prática do exorcismo como uma espécie de crendice, de superstição e e de coisas de pessoas simplórias, né? E curiosamente aí eu fui parei para pensar, né? Tá, mas o o Plotin ele tá criticando essa questão de exorcismo entre os gnósticos, mas nos evangelhos gnósticos propriamente, que alguns deles estão na no Evangelhos eh apócrifos, traduzido pelo Frederico Lourenço, também nos Evangelhos gnósticos, eu não lembro de nenhum episódio de exorcismo, que são evangelhos muito sofisticados também ponto de vista intelectual, né? são até difíceis de de ler, de de compreender, porque são esquemas cosmológicos complexos, com muitas entidades, eh o intelecto, eh, e as emanações do intelecto e coisas desse tipo. Então, é um discurso de um tipo que não é popular o discurso dos evangelhos gnósticos e não e o o exorcismo não tá lá de fato. Então, eu não sei exatamente a quem que Plotino tá direcionando essa crítica como essa crítica como os gnósticos, né? Mas de qualquer forma, isso é outra questão. O importante é que eh nesses evangelhos mais intelectualizados, com um discurso mais filosoficamente rebuscado, não vou dizer que tá mais correto ou mais ou mais incorreto. A questão é é é o a forma, né, de expressão do pensamento. Os evangelhos gnósticos são muito mais complexos eh do que os evangelhos que a gente encontra no Novo Testamento. Mas o que chega mais perto dessa sofisticação filosófica ou ou rebuscamento filosófico dos evangelhos gnósticos é o evangelho de João. E essa é justamente a a sugestão do Frederico Lourenço na nota de por que o Evangelho de João não fala sobre nenhum exorcismo de Jesus, que talvez especulação, né? Talvez o evangelho de João, por ser esse evangelho mais filosoficamente orientado, que fala sobre o logos, que tem um longuíssimos discursos complexos, tipo a oração sacerdotal, basta quem quiser abrir aí João 17 para ler um discurso de Jesus, você não vai encontrar nada nem remotamente parecido em qualquer outro evangelho. É muito é um discurso muito intricado, muito complexo, extremamente filosófico, né? Então, o Evangelho de João, ele tem essa característica diferente e parece estar voltado para um público diferente, um público talvez mais nas mais das elites intelectuais ali do mundo ah romano e talvez pegasse mal a ideia de exorcismos. Eh, então pode ser esse o motivo do Evangelho de João não mencionar nenhum exorcismo. Ou o contrário, né? Pode ser que, não o contrário exatamente, mas pode ser também que os evangelhos sinóticos tenham adicionado histórias de exorcismo ou exagerado histórias de exorcismo porque eram voltados mais para o público eh não tão letrado, intelectualizado. Aí você pode perguntar assim: “Ah, mas se o cara tá lendo o Evangelho, ele já é eh intelectualizado, já é um letrado, né? Mais ou menos. Na verdade, o texto era na antiguidade, ele era principalmente lido em voz alta, né? Ele era escrito para ser lido em voz alta. Essa prática de leitura silenciosa de você pegar um livro no conforto da sua casa e ficar passando o olho assim e ninguém nem ouve você nem fazendo pequenos sons com a boca. Isso é uma prática que não era não acontecia no mundo antigo, né? Então os texos eram escritos principalmente para ler em voz alta e consequentemente muita gente leu livros audiobooks, né? Eh, muita gente leu livros ouvindo. Então, os evangelhos, eh, o fato deles serem literatura, de serem produções literárias, né, no sentido de serem textos escritos, não significa que não tivessem penetração popular, que não fossem ouvidos, desfrutados eh pelo por pessoas eh que não sabiam ler, muito menos escrever, né? Então, eh, essa é mais ou menos a reflexão que eu queria compartilhar aqui, né, que o Evangelho de João não traz nenhum exorcismo, talvez por esse motivo cultural associado a um desprezo intelectual pelo exorcismo. Talvez seja esse o caso, mas o que é certo é que os exorcismos são uma prática extremamente antiga e difundida. Acho que pouca gente eh às vezes muita gente se surpreende quando eu falo isso, que existia exorcismo em outras culturas antes mesmo de Jesus e que outros judeus praticavam exorcismo também. Então esse é um ponto que eu acho que é interessante e que utilizei, eu usei esse, essa ocasião para compartilhar e também a questão, essa questão do do desprezo intelectual na antiguidade pelo exorcito, que eu achei muito curioso porque é mais ou menos o que a gente vê hoje também, né? Hoje a gente encontra muito mais relatos de exorcismo e a presença litúrgica, por assim dizer, de exorcismo em igrejas, né? a o o o eh é é muito mais frequente você encontrar cenas de exorcismo, performances de exorcismo em igrejas em que o público é menos elitizado, por assim dizer, né? Se você pega uma uma igreja protestante tradicional eh de classe média, classe média alta, sei lá, presbiteriana, você não vai encontrar muito raramente você vai ver alguma conversa sequer sobre exorcismo no mundo moderno. Enquanto que quando você vai em igrejas mais populares, você vai numa, não vou citar nomes de igreja aqui, mas vocês sabem bem o que que eu tô falando, vocês vão encontrar alguns cultos que são praticamente exorcismo de ponta a ponta, né, até com uma certa organização. exorciza um, aí depois exorciza o outro. Aí tem o testemunho do da pessoa que foi exorcizada, eh, e por aí vai, né? Então, parece que eh não sei, eu achei interessante assim esse eco histórico, né? Parece que as coisas não mudaram tanto assim, pelo menos eh na minha percepção em relação a essa atitude do sobre o exorcismo como um sinal de divindade, um sinal de superioridade espiritual. ou coisa semelhante. E é isso. A reflexão que eu queria compartilhar é essa.