A Farsa da Indústria da Água..(E como ela te faz de TROUXA)

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Toda vez que vou ao mercado comprar água eu 
me deparo com essas águas aqui. Uma custa 13, outra 14 e a outra incríveis 30 reais. Eu 
sempre passo por elas e fico pensando que ninguém realmente deve comprar essas garrafas.
Como eu sou um cara curioso, resolvi investigar, e descobri que existe toda uma indústria 
de água gourmet que vem crescendo no mundo, desde eventos para degustação de água até 
restaurantes que oferecem carta de água. Há garrafas como a Fillico, decorada com cristais 
Swarovski e vendida por mais de mil reais, ou a Kona Nigari, extraída do fundo do 
oceano e custando mais de 2 mil reais o litro. E ainda tem a Acqua di Cristallo Tributo 
a Modigliani, que chega a 300 mil reais – mas aí, o valor está mais na embalagem de ouro do que na 
água em si. Só que nem precisa ir tão longe. Hoje, no mercado, já existem águas de 100 e 200 reais, 
vendidas como se fossem experiências únicas. Então, como a indústria conseguiu 
transformar a água em luxo? E será mesmo que a água vendida em 
garrafas é melhor que a água da torneira? O fato é que a água, um elemento básico da vida, se tornou um produto de luxo, vendido 
com argumentos que lembram o mercado de vinhos e destilados. Marcas prometem 
águas de rochas vulcânicas no Havaí, de icebergs que derretem na Noruega ou de 
gotículas de névoa matinal na Tasmânia. Segundo a indústria, essas características 
influenciam na textura, sabor e mineralidade, criando um universo de diferenciação para algo 
que, em teoria, deveria ser apenas… água. O conceito ganhou força com a Fine Water Society, 
um grupo internacional que reúne marcas de água premium e organiza competições de degustação.
Segundo o cofundador do grupo, Michael Mascha: “A degustação de água era considerada 
uma ideia muito ridícula no início”. Bom, então acho que ainda estamos no início.
Ele complementa dizendo: “Comecei todo o processo há cerca de 20 anos, quando tive 
que parar de beber álcool”. Ah, tá explicado. Nesses eventos, os sommeliers analisam 
cada amostra, descrevendo notas suaves, toques aveludados e até harmonizando 
diferentes águas com determinados pratos. Para os especialistas, a água pode 
ser tão complexa quanto um vinho fino. Mas será que o paladar humano consegue perceber 
todas essas nuances? O sommelier Milin Patel definitivamente discorda de mim. Segundo 
ele, “água não é apenas água. Cada água no nosso mundo é diferente e tem um sabor”. Ele 
explica que elementos como cálcio, magnésio e potássio influenciam diretamente a experiência 
sensorial, tornando algumas águas: “suave, cremosa, formigante, aveludada, amarga e azeda”.
Tá, mas se a composição mineral realmente fizesse tanta diferença, por que tantas pessoas 
não notam essas diferenças no dia a dia? Para testar isso, um experimento no YouTube 
tentou provar justamente isso. Um criador de conteúdo decidiu criar sua própria marca 
de água de luxo, com um nome sofisticado, um rótulo elegante e uma história convincente.
Ele pediu para o público comparar a garrafa de água mais cara do mundo com a 
garrafa mais barata do mundo, perguntando qual era a diferença entre as duas.
Mas ninguém contava com a astúcia dele, porque o líquido dentro de ambas garrafas 
era nada mais do que água de torneira. E, curiosamente, isso não impediu as pessoas 
de tentarem justificar suas escolhas como verdadeiros sommeliers de água.
Um dos participantes foi direto ao ponto: “Oh holy sh*t, it tastes 
different. Texture is different too.” Esse experimento deixou claro que, quando há uma 
boa narrativa, uma bela história e uma embalagem bonita, as pessoas não apenas acreditam no que 
estão consumindo – elas se convencem de que aquilo é especial. No fim, não é o produto que 
muda. É a percepção que vendem junto com ele. E tudo bem, se isso faz algumas pessoas 
se sentirem melhores, bom pra elas. O experimento de rua provou que o público em 
geral não sabe diferenciar uma água da outra. Pensando bem, seria muito interessante ver os 
especialistas em água neste experimento com água de torneira do vídeo no Youtube.
Mas tem um experimento de outro produto que fez exatamente isso, e 
conseguiu enganar os especialistas. Por séculos esse mercado se vendeu 
como um ambiente exclusivo e refinado: o dos vinhos. Em 2022 eu fiz um vídeo 
sobre isso. Nele eu falo sobre um dos maiores escândalos da indústria vinícola.
Rudy Kurniawan, um suposto colecionador e vendedor de vinhos raros, faturou milhões ao 
falsificar garrafas de safras históricas e vendê-las para investidores e especialistas.
Ele simplesmente pegava vinhos baratos, misturava rótulos e os vendia por dezenas de 
milhares de dólares. O mais chocante é que nenhum dos especialistas percebeu a fraude. Pessoas 
que se diziam capazes de distinguir cada nota, cada safra e cada barril foram 
completamente enganadas por anos. Esse escândalo escancara 
uma realidade interessante: esses mercados não vendem qualidade, 
vendem status e pretensão, empurrando rótulos bonitos para gente disposta a pagar 
caro só para se sentir especial e diferentão. Talvez até baseado nesse “modelo 
de negócios” da indústria do vinho, a galera pensou que daria pra enganar mais um 
bando de gente com a indústria da água gourmet. Existem indústrias inteiras que se especializam 
em vender a percepção de que algo tem valor, ao invés de realmente ter valor. Enquanto as 
empresas de água gourmet tentam te convencer que água com “textura aveludada” vale 150 
reais, outras te convencem em investir Se a água gourmet é vendida como um artigo 
de luxo, a água engarrafada tradicional é uma necessidade. O marketing das grandes marcas 
nos convenceu de que beber água da torneira pode ser um risco, e que a única forma de garantir 
qualidade e pureza é pagando por um rótulo. Mas será que isso faz sentido?
Um estudo da Universidade de Columbia revelou que a água engarrafada contém quantidades 
alarmantes de nanoplásticos, partículas tão pequenas que podem atravessar o intestino e 
os pulmões, entrar na corrente sanguínea e se alojar em órgãos como o coração e o cérebro. Os 
pesquisadores analisaram três marcas populares de água nos EUA e encontraram entre 110 mil e 370 
mil partículas de plástico por litro, sendo que 90% delas eram nanoplásticos – um número 10 a 100 
vezes maior do que qualquer estimativa anterior. Os cientistas também descobriram que parte desses 
plásticos vem dos próprios filtros usados para “purificar” a água antes do engarrafamento. Ou 
seja, em vez de garantir um produto mais limpo, esses filtros podem estar contaminando 
ainda mais a água com micro e nanoplásticos. Mas o dado mais preocupante é que os sete tipos 
de plástico identificados no estudo representam apenas 10% do total de nanopartículas encontradas 
– os outros 90% ainda são um mistério. Se todos forem plásticos, o número real de fragmentos 
pode chegar a dezenas de milhões por litro. Os pesquisadores já estão expandindo suas 
investigações para além da água engarrafada. “Existe um enorme mundo de nanoplásticos 
a ser estudado”, disse Wei Min, biofísico da Universidade de Columbia e coautor da 
pesquisa. Ele destacou que, em termos de massa, os nanoplásticos representam uma quantidade muito 
menor do que os microplásticos, mas alertou: “Não é o tamanho que importa. São os números, 
porque quanto menores essas partículas são, mais facilmente elas podem entrar em nós.”
A ironia é que um dos principais argumentos das empresas para justificar os preços das 
garrafas é justamente a “pureza” da água vendida. Mas o problema não para por aí. Durante 
anos, marcas gigantes do setor venderam água purificada de torneira como se 
fosse água mineral de fonte natural. Na França, uma investigação revelou que a Nestlé 
estava engarrafando e vendendo água tratada como se fosse de nascente – algo expressamente 
proibido pela legislação francesa. Quando o escândalo veio à tona, a empresa admitiu a fraude, 
mas por anos milhões de consumidores pagaram por algo que poderiam ter obtido em casa de graça.
E o pior: essa prática não é exclusiva da Nestlé. Estudos indicam que quase metade da água 
engarrafada vendida no mundo vem diretamente da torneira, passando por algum tipo de 
filtragem ou teste antes de ser vendida. E aí a indústria da água gourmet se 
confunde com a da água engarrafada normal, que nós bebemos todos os dias. Muitas vezes, 
não é pela qualidade da água, mas pelo marketing agressivo e a ilusão de segurança.
Comerciais reforçam a ideia de que beber água engarrafada é mais saudável, mais confiável e 
essencial para quem se preocupa com o bem-estar. A estratégia funcionou tão bem que hoje os 
consumidores aceitam pagar até 2.000 vezes mais pelo mesmo líquido que sai da torneira.
E enquanto bilhões de garrafas plásticas são vendidas todos os anos, os impactos ambientais 
desse consumo desenfreado são ignorados. O consumo dessas embalagens gera toneladas de resíduos 
que muitas vezes não são reciclados, agravando ainda mais a crise do plástico nos oceanos.
Água engarrafada é uma ótima ideia de acesso a um recurso essencial para nós humanos e 
ela não vai deixar de existir simplesmente porque causa um impacto ambiental, o que 
temos que fazer é destinar corretamente as embalagens pra mitigar os impactos.
A questão é que o que antes era um recurso acessível e democrático, agora é controlado 
por grandes corporações que vendem uma falsa sensação de exclusividade e segurança.
Mas se a água engarrafada já se mostrou um negócio baseado em exageros e manipulação, 
até onde essa farsa realmente vai? Se a indústria da água engarrafada já vendeu 
água de torneira como se fosse mineral e inundou o planeta com microplásticos, os problemas 
não param por aí. Algumas marcas foram além: venderam água contaminada.
Testes laboratoriais encontraram bactérias nocivas em lotes de água engarrafada, 
incluindo coliformes fecais – um indicativo de contaminação por esgoto. Em algumas amostras, 
foram detectadas até bactérias que podem causar diarreia e infecções graves, algo inaceitável 
para um produto que se vende como “puro e seguro”. Enquanto isso, na indústria gourmet, algumas 
marcas vendem água capturada da névoa matinal ou extraída de icebergs derretidos por preços que 
chegam a centenas ou até milhares de dólares. Hoje, 2,2 bilhões de pessoas sequer têm 
acesso à água potável, e ainda assim, há um mercado bilionário que transforma esse 
mesmo recurso em um artigo de luxo para poucos. Enquanto isso, tem gente pagando 
por água mineral engarrafada achando que está tomando algo saudável.
Uma investigação do EXTRA revelou um esquema alarmante de adulteração na venda de água 
engarrafada por ambulantes no Rio de Janeiro. Das 30 amostras testadas, 28 estavam adulteradas, e 
duas continham coliformes fecais, uma contaminação que pode causar diarreia e doenças graves. Segundo 
Ghandi Giordano, professor de engenharia sanitária da UERJ, “o perigo é invisível. Não dá para 
acreditar apenas no visual, já que nessas amostras a água sequer estava turva” (fonte 8).
Mas a fraude vai muito além da contaminação: muitos ambulantes compram garrafas vazias 
com lacres intactos para encher com água de origem desconhecida, enganando consumidores que 
acreditam estar comprando água mineral legítima. Em alguns casos, essas garrafas são 
reaproveitadas depois de serem coletadas por catadores, sem qualquer tipo de higiene.
A polícia suspeita que esse comércio ilegal movimente milhões de reais por ano e pode estar 
sendo explorado por milícias e facções criminosas, que usam a venda de água adulterada 
como mais uma fonte de lucro. E não são apenas pequenos ambulantes que cometem 
esse tipo de irregularidade. Algumas das maiores marcas do mundo já precisaram retirar produtos 
do mercado após escândalos de contaminação. Na França, além da fraude da Nestlé ao vender 
água de torneira como se fosse mineral, um relatório revelou que seus produtos estavam 
regularmente contaminados por bactérias, como a Escherichia coli, bactéria ligada à 
presença de fezes e riscos à saúde, além de resíduos químicos derivados de pesticidas.
Ou seja, a suposta “água pura” que os consumidores pagavam caro continha traços 
de veneno agrícola. Segundo o relatório, “os recursos aquíferos explorados pela 
Nestlé são regularmente contaminados microbiologicamente” e a empresa usou tratamentos 
proibidos para tentar ocultar o problema. Mas a questão principal não é só a contaminação 
ou o preço abusivo – é a ilusão vendida para o consumidor. Assim como sommeliers analisam 
águas gourmet descrevendo supostas “notas aveludadas” e “texturas cremosas”, as grandes 
marcas de água engarrafada construíram um império vendendo a falsa sensação de segurança.
No fim das contas, ambos os mercados se baseiam no mesmo princípio: convencer as pessoas de que 
estão pagando por algo extraordinário, quando na verdade estão apenas comprando uma embalagem 
mais sofisticada e uma narrativa bem contada. E é exatamente assim que essa indústria 
funciona: eles não vendem água — vendem uma historinha embalada em plástico 
brilhante. Elaboram um rótulo bonito, falam que a água veio de uma fonte da colina 
sagrada no Himalaia e deu — 150 reais o litro. Pra te convencer ainda usam as 
expressões “aveludada” e “cremosa”. A verdade é que não estão te entregando 
um produto melhor. Estão vendendo ego engarrafado. Status num mísero gole. No fundo, 
o que você tá comprando não é água — é o direito de se sentir especial enquanto bebe a 
mesma coisa que sai da sua torneira.

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