NINGUÉM sabe onde está a CONSCIÊNCIA HUMANA

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Você já parou pra pensar de onde vem os seus pensamentos? Você provavelmente respondeu do cérebro. E sim, você está certo. Seus pensamentos vêm de dentro dele. Mas de onde exatamente dentro dele? Onde é que dentro do cérebro está essa coisa ou coisas que fabricam os nossos pensamentos? E essa pergunta pode ser feita de outro jeito. Onde a consciência fica dentro do nosso cérebro? E sabe o que é ainda mais angustiante? Mesmo depois de milênios, ninguém sabe a resposta. forma você tem um monte de pensamentos lotando a sua cabeça e pelo menos nesse caso você também está consciente deles. Mas diferente das suas pernas e braços você não pode tocar nos seus pensamentos. Você é formado por um corpo e uma mente ou uma mente e um corpo e é aqui que as coisas ficam ainda mais interessantes. Porque há milênios, muita gente considera que essas duas coisas são diferentes. Mas será que são mesmo? Será que a nossa mente é uma entidade independente do nosso corpo? Será que ao invés de um, todos nós somos, na verdade, dois? Um corpo mais uma mente? e que o nosso corpo é formado por átomos e a interação deles, então os nossos pensamentos e a mente são feitos do quê? Pra desvendar esse enigma, nós temos que voltar no tempo. Essa é uma pergunta que o ser humano tenta responder há mais de 2 mil anos. E nesse período surgiram pelo menos duas correntes principais sobre o assunto, com visões completamente opostas. A mais popular das duas provavelmente é o dualismo, que vem do latim dualis, que quer dizer dois, e de ismo, que significa sistema ou doutrina. O dualismo é um sistema composto por dois elementos distintos, sejam eles quais forem, e em alguns casos completamente distintos, como na discussão sobre a consciência. O conceito, aliás, já era discutido na Grécia Antiga por Platão. Ele citava a existência de um mundo sensível, que é um mundo que nós podemos ver, tocar e interagir. Só que esse mundo seria apenas uma cópia do mundo das ideias, chamado de mundo inteligível. Já na Idade Média, Santo Agostinho bebe da filosofia platônica e, já convertido ao cristianismo, agrega um caráter religioso ao dualismo da consciência, que passa a conceber o homem como um ser formado por um corpo do plano terreno e uma alma de dimensão espiritual. No raciocínio dele, os dois cooperam de forma harmônica, mas a alma é considerada um elemento de, abre aspas, densidade ontológica superior. Traduzindo para português, Santo Agostinho acreditava que o corpo não teria o poder de afetar a alma. Mas o verdadeiro divisor de águas nessa história é o físico e filósofo francês René Descartes. Você provavelmente já ouviu falar dele ou da famosa frase: “penso, logo existo”ISTO. O trabalho de Descartes foi tão impactante que ele marca um antes e um depois no debate moderno sobre a verdadeira natureza da nossa mente e do nosso corpo. Na época de Descartes ainda não existiam eletrodos para analisar os sinais elétricos de um cérebro. A única forma de ver um cérebro humano era abrindo a cabeça de alguém. Eu não sou especialista em cérebros, mas parece ser bem difícil de fazer isso em um humano ainda vivo. Mas isso não impediu que Descartes pensasse bastante sobre a mente, o corpo e a relação entre os dois. Foi assim que ele chegou ao dualismo cartesiano. A realidade pode ser reduzida a duas instâncias fundamentais, as substâncias extensas e as substâncias pensantes. Uma substância extensa é tudo aquilo que ocupa espaço, tem dimensões no mundo físico e, por isso, está sujeito às leis da física. Pensando assim, o corpo humano é uma substância extensa, assim como uma árvore e um Yorkshire. Já a substância pensante, é aquilo que pensa, ou seja, tudo aquilo que tem consciência, ideias e raciocínio, mas que não ocupa lugar no espaço e por exclusão não está sujeito às leis da física. Pensando como alguém do século 17, a ideia de que a mente e o corpo são entidades separadas faz bastante sentido, porque tanto a minha perna quanto a minha mente parecem existir, mas uma é tangível, eu posso tocar, e a outra não. E admitindo que essas duas coisas realmente coexistem, elas são no mínimo diferentes. O problema é que se alguém chutar sua perna, é a sua mente que sente dor. Ou melhor, é a sua mente que vai processar e entender o que está acontecendo com o seu corpo. E se a mente afeta o corpo e vice-versa, a pergunta que o dualismo cartesiano precisava responder para virar uma ideia completa é como isso acontece? Se a mente e o corpo são substâncias diferentes que não se tocam, como que elas afetam uma outra? Essa questão ganhou até nome, problema do comércio. Traduzindo, o problema do comércio é o problema da troca entre o psíquico e o físico. Para Descartes, esse ponto de interação se localizava no cérebro, exatamente na glândula pineal, considerada por ele como a sede da alma. Só que essa ideia foi considerada um tanto problemática exatamente por sugerir que uma substância imaterial afetaria uma substância material sem apresentar evidências racionais dessa correlação. E esse não é um “calcanhar de Aquiles” só pra hipótese da glândula pineal. O dualismo como um todo tem dificuldades de vencer questões que a ciência foi capaz de responder. O monismo do qual eu estou falando nesse caso se confunde com a visão materialista de que a mente é parte dos fenômenos gerados pela matéria do corpo. Ou melhor, que a mesma substância que forma nosso corpo também forma nossa mente. A partir daí, o problema deixou de ser a dualidade mente-corpo e se transformou na unidade mente-cérebro. No fim do século 19, pesquisadores já tinham identificado a existência de alterações de corrente elétrica na superfície do córtex cerebral em animais como macacos e coelhos. Um dos primeiros a notar esses fenômenos foi o fisiologista inglês Richard Caton. Em 1875, ele observou variações elétricas ao comparar os cérebros de animais anestesiados e despertos. Essa descoberta foi fundamental para estabelecer a ideia de que o cérebro não era apenas um órgão passivo, e sim um sistema dinâmico de processamento de informações. Mas a mudança de paradigma nos estudos veio com a invenção de um método capaz de medir atividades cerebrais sem precisar abrir a cabeça de ninguém. Em 1929, o psiquiatra e neurologista alemão Hans Berger desenvolveu o revolucionário eletroencefalograma. Foi por meio dele que Berger demonstrou que o cérebro humano exibia atividade elétrica oscilatória registrada como um padrão de ondas e que a atividade cerebral varia conforme mudanças nos estados mentais e físicos. O aparelho permitiu identificar, por exemplo, que diferentes padrões de ondas cerebrais correspondem a diferentes estados de consciência. Em maiores níveis de alerta, as ondas cerebrais apresentam padrões irregulares e baixa amplitude. Já durante o sono, quando a consciência é mínima, as ondas cerebrais se tornam muito mais lentas e apresentam grande amplitude. Além disso, foi possível ver que estímulos sensoriais, privação de oxigênio e distúrbios neurológicos como a epilepsia também causam alterações nas ondas cerebrais. O eletroencefalograma ainda ajudou a identificar a existência de circuitos neurais associados a processos cognitivos, sugerindo que funções mentais complexas tinham bases materiais no cérebro. E com a tecnologia, ficou cada vez mais difícil de sustentar a ideia de que a mente era uma entidade independente do cérebro. Tá, e depois disso tudo, você ainda lembra da pergunta que eu fiz no início desse vídeo? Onde a consciência fica dentro do nosso cérebro? Agora é hora de entender por que é tão difícil de responder essa pergunta. Nós até podemos tentar usando uma base de estudos científicos relacionando correntes elétricas com estados mentais, mas é aí que tudo se complica. Se os dualistas tinham que resolver o problema do comércio para explicar como duas substâncias separadas se relacionam, os monistas tem outro problema tão grande quanto para resolver. Eles precisam explicar como esse corpo feito de matéria gera a experiência da consciência. Colocando de outra forma, os monistas precisam responder onde a consciência se localiza no nosso cérebro. Mas antes mesmo de pensar em começar, primeiro precisamos entender exatamente o que é essa consciência que nós estamos procurando para conseguimos identificá-la quando dermos de cara com ela. Você me vê. E se você me vê, você sabe que está vendo Pedro Loos. Mas mais do que isso, você sabe que é você que está me vendo. Ou seja, você sabe que você sabe. Perfeito! É isso que eu quero chamar de consciência. A sua ciência é saber que você está me assistindo. E a consciência é refletir sobre o fato de estar me assistindo. Você pode pensar, eu vejo o Pedro e gosto dos vídeos dele, então eu vou clicar no botão de me inscrever. Você pode até não perceber quando isso acontece, mas isso é a sua consciência interferindo na sua percepção. Ciência é saber. Consciência é saber que sabe. E aqui vai um exemplo. Se você colocar sua mão perto do fogo sem querer, ela vai se afastar das chamas antes mesmo que você pense em fazer esse movimento. Isso acontece por causa do arco reflexo, um movimento automático que permite que o nosso corpo responda a estímulos antes mesmo que a informação desses estímulos chegue ao cérebro. E nesse caso, sua mão sabe se afastar do perigo sozinha. Mas ela não sabe que sabe se afastar do perigo, ela não tem consciência das capacidades dela, ela apenas tem as capacidades. Ou seja, por tentativa e erro, nós já sabemos que a consciência provavelmente não tá na sua mão. Mas então, onde está a consciência? No cérebro mesmo? Sim, pelo menos em parte. Inclusive, o eletroencefalograma nos permite encontrar os chamados correlatos físicos, que são a expressão da consciência no cérebro. Isso acontece porque quando você lembra de algo, uma área específica do cérebro entra em atividade. Quando você tem emoções extremas, outras áreas são ativadas, e assim por diante. Parece existir uma linha de causa e efeito entre acontecimentos, processos físicos do nosso cérebro e estados de consciência específicos. Mas, como diz o filósofo australiano David Chalmers, relacionar sinais elétricos com comportamentos é o problema fácil da consciência. O que complica a história é a segunda parte do desafio, que é explicar como esses sinais elétricos são capazes de gerar uma experiência subjetiva. Por que nós não somos apenas um saco de reflexos iguais aos da mão no fogo, que agem no piloto automático sem pensamentos profundos? Para conectar a mente e o cérebro, é preciso traduzir como esses processos físicos geram essa experiência pessoal de passar raiva ou frio. E isso seria um análogo a criar uma espécie de dicionário da consciência. Mas criar esse dicionário é um problema extremamente difícil. O ser humano aprendeu a mapear qual área do cérebro é ativada quando está pensando algo, mas não conseguiu traduzir o conteúdo do que está sendo pensado ou sentido. Essas sensações objetivas que vêm da consciência são o que os filósofos chamam de qualia. É o sentimento que eu tenho quando escuto uma determinada música, quando eu como uma determinada comida ou quando eu volto a casa onde passei a minha infância. A qualia é o nome que se dá ao conteúdo da minha memória. É a lembrança que só eu tenho dos momentos que eu vivi com os meus amigos na faculdade, porque só eu vivi aquilo daquele jeito. É o cheiro de café que eu sinto de manhã, que é diferente do cheiro que você sente, porque você tem a sua própria experiência subjetiva. O problema difícil da consciência é traduzir experiências físicas em qualias e vice-versa. Perfeito! Então a sua consciência fica exatamente onde os seus qualias são gerados. E onde exatamente estão os qualias? Boa pergunta. O materialista David Chalmers, que eu citei agora há pouco, aposta no panpsiquismo. A teoria defende que tudo, em algum grau, tem uma quantidade de consciência. E que essa consciência é uma substância à parte, como no dualismo, mas ainda assim formada por átomos, quase como uma nova força da natureza capaz de afetar a matéria assim como faz a gravidade. Eu sei que de antemão a ideia parece ousada, mas Chalmers é um filósofo sério, além de que ele não é o único a defender essa ideia. Alguns cientistas, por outro lado, defendem que a consciência é um campo eletromagnético gerado pelas ondas cerebrais e portanto, não é formada por matéria, e sim energia. Outros acreditam que ela é uma experiência unificada produzida pela interação de diferentes partes do cérebro, e que a expressão física da consciência fica na parte de trás da cabeça. Essas e muitas outras teorias estão repletas de diferenças entre si. Talvez o único ponto em comum é que nenhuma delas apresentou evidências conclusivas de que estão certas. Mesmo que o ser humano já tenha decifrado como funciona o cérebro, a subjetividade humana permanece com uma barreira ainda intransponível. O que eu acho fascinante nisso tudo é que talvez essa seja uma das raras perguntas sem resposta; não porque ainda não sabemos responder, e sim porque ela está em uma fronteira que a ciência talvez não alcance. Mas e pra você, algum dia nós vamos conseguir entender tudo sobre a consciência?

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