O Brasil é injusto com os EUA? Veja o que os números dizem sobre as tarifas de Trump

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O Trump tá dizendo que o Brasil é injusto no comércio com os Estados Unidos. Será? Esse é o principal argumento econômico que o presidente dos Estados Unidos usou quando anunciou as tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados para lá. Mas aqui a gente vai olhar os dados e entender se eles de fato confirmam essa percepção. Essa aqui não é uma análise política, tá? Ela é técnica com base em fatos e levantamentos. Você vai ver comigo o que que há de verdade e o que que é mais discurso nessa história. Enquanto isso, não se esquece de seguir o Invest News, beleza? Vamos lá. Então, o Trump começa a carta falando sobre as tarifas que o Brasil cobra de produtos americanos. Segundo ele, são tarifas injustamente altas e por isso os Estados Unidos deveriam responder. É verdade que o Brasil tem tarifas médias mais altas que a dos Estados Unidos. Em 2022, a tarifa média simples aplicada pelo Brasil foi de 11,3% contra 2,2% nos Estados Unidos. Segundo o levantamento da Organização Mundial do Comércio, citado nessa matéria aqui da BBC Brasil. É uma diferença grande, né? Mas essa é uma média simples que considera todos os produtos de uma maneira igual. Quando a gente leva em conta o volume real das importações, ou seja, os produtos que de fato entraram em maior quantidade, essa tarifa média efetiva do Brasil cai bastante. Ela vai para 4,7%, segundo um estudo da FGV. Pela mesma métrica, os produtos brasileiros sofreram taxação efetiva média de 1,3% ao entrarem nos Estados Unidos. Esse é um cálculo complicado porque em geral as tarifas se aplicam a produtos específicos, não a países. Considere que, por exemplo, quase metade das importações brasileiras vindas dos Estados Unidos entra aqui com isenção, é tarifa zero e outros 15% dos produtos vindos de lá pagam no máximo 2%. Isso acontece porque existem os regimes especiais. Eles são mecanismos que o Brasil usa para atrair investimentos e integrar a sua indústria às cadeias globais de produção. Ou seja, não são produtos que costumam concorrer com produtos feitos nos Estados Unidos. Eles são partes, peças ou insumos que sim são feitos aqui. Aí eles são comprados por empresas americanas e usados lá para produzir outras coisas que comum são exportadas dos Estados Unidos para outros países, gerando empregos e receitas lá na terra do Trump. Então, sim, tem uma diferença tarifária, só que ela não é tão grande quanto parece à primeira vista. E os próprios dados mostram que boa parte das exportações americanas pro Brasil já entra com tarifas baixas ou até nulas. Voltando pra carta, o Trump fala algumas vezes em barreiras não tarifárias do Brasil. E sim, barreiras não tarifárias existem e elas não são só exclusividade nossa. O Brasil exige registro da Anvisa para importação de cosméticos, por exemplo, também para alimentos e remédios. Brasil também aplica cotas para entrada de etanol estrangeiro e tem normas técnicas que, embora legítimas, acabam funcionando como barreiras indiretas. Mas esse tipo de barreira também é comum nos Estados Unidos, especialmente para produtos alimentares e farmacêuticos. O próprio governo americano impõe uma série de exigências técnicas e sanitárias para produtos brasileiros, como a carne bovina, por exemplo. Ou seja, a barreira, sim, mas elas são recíprocas e geralmente fazem parte de normas de segurança, saúde pública ou controle de qualidade. Comparar essas medidas sem olhar o contexto pode distorcer o argumento. E olha como que ele constrói o argumento. Ele diz que as barreiras tarifárias e as não tarifárias, abre aspas, causaram esses déficit comerciais insustentáveis contra os Estados Unidos. E continua, ele disse: “Esse déficit é uma grande ameaça à nossa economia e de fato à nossa segurança nacional”. Só que tem um probleminha nesse argumento. Os Estados Unidos não tem déficit comercial com o Brasil. Não tem. Dá uma olhada nesse gráfico. Nos últimos 10 anos, o Brasil importou mais do que exportou pros Estados Unidos. 2015, 2016, 2017. Aí acelera até 2024. É sempre défic Brasil. Entre 2015 e 2024 a gente tá falando de 44 bilhões e 100 milhões de dólares de saldo positivo para os Estados Unidos. Então, perceba, de fato, a alíquota média que o Brasil cobra dos produtos vindos dos Estados Unidos é sim maior que a alíquota média que os Estados Unidos cobram da gente. E sim, existem as barreiras não tarifárias e tal, mas isso tudo não levou a um déficit por parte dos Estados Unidos. O Trump mistura os argumentos e dados para chegar a uma conclusão que simplesmente não é verdadeira. E tem um lance importante aqui. O Trump equivale déficit a um tipo de derrota. desvantagem. Só que não é assim que funciona. Se você vai na padaria aí do seu bairro e gasta R$ 5 comprando pão, R$ 10 comprando mussarela e a padaria não compra nada de você, então você tem um défic de R$ 15 com a padaria, né? Mas pensa, quanto tempo e dinheiro você teria que gastar para fazer o seu próprio pão ou a sua própria mussarela? Na prática, você tá usando seus recursos, tempo, qualificação, habilidades em alguma atividade que te dá mais grana justamente para você poder comprar as coisas. É a lógica do capitalismo, conseguir alocar recursos de maneira mais eficiente. Bom, vamos voltar pro Trump e pra nossa DR com os Estados Unidos. Eles são o nosso segundo parceiro comercial mais importante. A gente vendeu 40 bilhões de dólares em produtos para eles no ano passado. Mas o nosso maior cliente mesmo é a China. Foram 94 bilhões de dólares em 2024. Só que tem uma diferença importante. Esse gráfico aqui é o nosso perfil de exportação pra China. Dá uma olhada. 36% de produtos agropecuários, tipo soja, 44% indústria extrativa, tipo minério de ferro, e só 19,5% de indústria de transformação, que são os produtos industriais feitos em fábricas, que são aquelas empresas disputadas por estados e cidades, porque afinal elas geram muitos empregos que pagam bons salários, que vira consumo, enfim, você entendeu? Agora dá uma olhada no que a gente exporta pros Estados Unidos. Quase 80% de produto industrial, só 15% de indústria extrativa e menos de 6% de produtos agropecuários. Isso significa que esse tarifaço do Trump acerta em cheio algumas das nossas indústrias de maior valor agregado, tipo a BRAER, cujos aviões, aliás, são dominantes na aviação regional dos Estados Unidos. Isso é um problemão, porque como escreveram meus colegas de Invest News nessa reportagem aqui de fevereiro de 2025, as commodies que nos perdoem, mas os produtos de alto valor agregado são fundamentais. Eles dão luz a economias mais complexas, sólidas. Eles geram os melhores empregos, criam demanda por educação de ponta. Um ataque tarifário dos Estados Unidos que afetasse essa área, então, seria particularmente doloroso. Foi quase uma profecia na qual o profeta não tem prazer nenhum. E é exatamente o que tá acontecendo agora. E economicamente falando, simplesmente não faz sentido. Como a própria carta do Trump deixa claro logo nos dois primeiros parágrafos, esse tarifaço tem razões políticas. [Música]

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