Olhar do Amanhã: depois do vídeo de Felca, regulação das redes é assunto em Brasília
0E hoje é quarta-feira, chegou a hora da coluna Olhar do Amanhã. [Música] E vamos receber Dr. Álvaro Machado Dias, que é professor da UNIFESPs, neurocientista, futurista, colunista aqui do Olhar Digital. Vamos receber o Dr. Álvaro Machado Dias. Olá, boa noite Dr. Álvaro Machado Dias. Seja muito bem-vindo ao Olhar Digital News. Depois de uma mini férias, pelo que eu sei, não é isso? É isso aí, Marizan. Muito boa noite. Boa noite, Dr. Álvaro. Bom, vamos começar, Dr. Álvaro, hoje falando sobre eh uma questão que está muito em pauta. Havia uma expectativa de que o presidente Lula enviasse hoje ao Congresso Nacional um projeto de lei para regulamentar as redes sociais. Esse assunto voltou ao foco do debate político depois do vídeo produzido pelo youtuber Felka, que está dando o que falar e que denunciou uma série de abusos e exposições de crianças e adolescentes nas redes. Diante disso, Dr. Álvaro, como podemos esperar eh ou o que podemos esperar dessa regulamentação? Então, eh, no programa do do Reinaldo Azevedo, o Lula falou na na Band News que mandaria uma proposta do governo pro Congresso hoje, tá? Que tinha uma reunião eh do governo com o Congresso e que essa proposta discutiria aí o o bom e velho tema da regulação das redes sociais. Agora, a gente tem que lembrar que tem uma proposta que, aliás, a gente já falou sobre ela aqui, que foi aprovada no Senado no final do ano passado e que está parada na na comissão de comunicação da Câmara, tá? Então, eh, eu fiquei pensando, mas que raios de proposta nova é essa? Provavelmente é uma proposta que replica, ao menos em parte, o conteúdo da que já está eh tramitando, né? E aí, quais são os pontos importantes? Portanto, respondendo a sua pergunta, o que que a gente pode esperar de uma proposta, seja ela uma nova? Ou seja, agora da tramitação da proposta que está esperando ser reativada lá na Câmara. Primeiro ponto é a necessidade das empresas chamadas bigtecs de retirarem sem ordem ordem judicial os vídeos e imagens de abuso sexual infantil eh da da das redes assim que elas forem notificadas. Isso segue a linha da decisão do Supremo que declarou a inconstitucionalidade do artigo 19 do MCI, né, do Marco Civil da Internet, que foi outro assunto que a gente discutiu profundamente aqui, tá? Então, eh, vamos dizer que há uma sobreposição do ponto de vista legal, mas que a necessidade de ser explícito no domínio das redes sociais, porque é onde esse problema está pipocando. O segundo ponto, e esse eu acho que ele traz realmente uma mudança de paradigma, é a necessidade das plataformas que que oferecem conteúdos pornográficos de terem métodos muito, entre aspas, confiáveis para verificação etária dos usuários, ou seja, para que a gente possa saber que quem tá entrando ali não é menor de idade. o o problema da exposição de menores à pornografia se tornou endêmico, né? Isso é uma, a gente também já discutiu aqui, é algo que, enfim, tá impactando de fato as adolescências e os relacionamentos nessa fase da vida, eu diria que em todas. E é um problema que realmente precisa ser enfrentado de maneira muito transparente, muito direta, porém existe uma questão de de identidade, né? de preservação da identidade dos usuários dessas dessas plataformas, que é muito sensível. Então, esse ponto que eu acho que é o o, vamos dizer assim, o mais relevante paraa sociedade, considerando o tema para sexualidade como um todo, eu acho que ele ainda vai eh causar aí muita espécie, muita dor de cabeça. Finalmente, as plataformas possivelmente terão que solicitar documentos oficiais comprovando a identidade eh de crianças e adolescentes que queiram ter contas nas redes. Então, hoje em dia, por exemplo, no YouTube, você tem o YouTube Kids, que é uma plataforma é ligada a a a a família em que os pais autorizam eventualmente essa produção de conteúdo para quem tem até 13 anos. E 13 aos 18, esse adolescente estaria sob o controle dos pais, mas tem liberdade para postar o que quiser. E os comentários também podem acontecer lá no YouTube. Que que acontece? Eh, esse e essa fase ela deveria ser controlada de maneira mais rigorosa. A mesma coisa no Discord e em outras plataformas. Vai ser um debate complicado porque o o o diabo mora nos detalhes, né, Marizá? E aqui a grande questão é como que esse controle de identidades vai ser feito, preservando eh eh a a a identidade desses pais e inclusive evitando o armazenamento desses dados porque a LGPD não permite. Então eu diria que esses são os principais pontos em discussão quando a gente tá falando desse assunto que é sexualidade de redes à luz do problema da pedofilia que é endemico no Brasil. Pois é, como você mencionou, já tinha um ali parado, mas essa denúncia deu uma acendeu novamente a fogueira, digamos. assim para colocar em votação. Agora, Dr. Álvar, de que forma o algoritmo das redes favorece esse tipo de conteúdo denunciado pelo Felka? Porque não estamos falando basicamente somente de adolescentes presentes no vídeo, porque ele também, né, aparecia, tinha outros adultos que apareciam no vídeo. Enfim, como que os algoritmos eh podem favorecer esse tipo de conteúdo? E mais, o que a regulamentação pode mudar nesse caso, certo? Olha só, os algoritmos em geral eles buscam maximizar o tempo de tela dos usuários e, em grande medida, eles são agnósticos, ou seja, eles são insensíveis ao conteúdo veiculado. O sujeito que tem atração por crianças e pré-adolescentes, ele ficará mais tempo navegando se ele puder acessar esse material. E é isso que a plataforma lhe oferece. Ou seja, o problema está em não tratar a especificidade do caso. E é isso que acaba favorecendo a pedofilia e outros comportamentos ilegais. Eh, o tratamento, olha que interessante isso, né? a gente fala tanto sobre isonomia, sobre eh tratamentos idênticos, sobre liberdade de expressão, mas é justamente a falta de seletividade, de critério para tratar casos diferentes, casos espúrios de maneira própria que gera esse problema do ponto de vista algorítmico, tá? Então, quer dizer, não tem nada que as redes estão fazendo para levar as pessoas a verem mais conteúdos impróprios, pedofilia, o que é que seja, isso não existe. O que existe é falta de especificidade de tratamento do problema para mitigá-lo. O que que essa essa abordagem traz de mais pro fundo? que existe algo muito mais sério, o verdadeiro problema, por assim dizer, que está nos adultos que exploram esses conteúdos, não simplesmente no público, tá? Que muitas vezes inclusive tem transtornos psiquiátricos e tal, enfim, eh questões que fogem a a a esfera eh do da criminalidade e da moralidade. Também tem esse outro lado, tá? desvios de personalidade, desvios que muitas vezes estão ligados também até transtornos neurológicos. Isso aí é mais do que conhecido. Agora, grande questão são esses familiares e terceiros que exploram essas crianças e adolescentes para ganhar uma grana, tá? Eh, e isso daí quando a gente vai olhar de maneira mais ampla se aplica também a, por exemplo, a plataforma Kids do YouTube, tá? que na minha visão ela é como se a gente concentrasse todos os faróis do mundo, tá bom? onde você tem trabalho de trabalho legal de criança numa sua plataforma, porque tem um monte de adulto monetizando trabalho de criança sem repassar, sem nada, o que evidentemente eh vai acontece é o arrepio da lei. Então acho que a gente tem que olhar essa questão também eh sobretudo responsabilizando quem está se beneficiando desses conteúdos, que está fazendo isso em grande medida para encher o bolso, além de eventualmente satisfazer suas perversões. Então esse é o ponto principal e eu acho que que respondendo aí muito diretamente ao ponto da regulação, é aí que eu acho que ela tem que ir. a gente tem que responsabilizar de maneira muito mais incisiva quem está explorando crianças, seja de maneira sexual, que isso é crime, cadê e ponto final, seja eh também como trabalho infantil, muitas vezes velado, como uma brincadeira da família, que no final das contas acaba sendo um uma uma brincadeira trabalho para essa criança que se vê forçada a rotinas de gravações de horas e horas e a uma infância e adolescência completamente atípicas. Com certeza. Bom, vamos acompanhando bem de perto aí a evolução desse assunto que é muito sério, né, Dr. Álvaro? Agora vamos mudar um pouquinho de assunto para outro tema que está aí bastante em pauta. A gente vem falando aqui sobre o GPT5 que chegou na semana passada e será muito bom ouvir a sua opinião a respeito. Você já teve a oportunidade de utilizá-lo e dizer pra gente com a sua avaliação? Sim, utilizei, testei, comparei também a luz dos benchmarks existentes e de outros benchmarks que ainda não são validados, semiexistentes, estão surgindo por aí e que eu acredito que vão ser importantes no futuro. E a minha percepção é que há um ganho incremental muito focado em programação. Eu acho que o o curioso na no nesse lançamento é que ele dá a sensação que o pessoal da Open Ei assume que programação é o grande trabalho da humanidade. A humanidade programa, que é coisa de gente que trabalha com software. E aí se o se o se o programa deles melhora um pouquinho programação, ele deu um grande salto. Porém, isso não é verdade quando a gente analisa de maneira mais ampla a qualidade dos resultados entregues pelo GPT5. Aliás, até em programação ele assim e do ponto de vista do principal benchmark de programação, ele ele se tornou o o líder, né, o ele tá no topo do leaderboard. Mas do ponto de vista do que as pessoas vêm falando, sobretudo nas empresas onde esses esses softwares são usados para mexer em ferramentas muito complexas, o Clou Opus 4.1 continua na frente. Agora, independentemente disso, o fato é que o que a gente esperava, né, o que o mercado esperava, até porque a própria Open trouxe essa expectativa, era de um salto disruptivo a lá inteligência artificial geral, AGI. Isso definitivamente não aconteceu. E eu acho que a avaliação principal que que eu tenho aqui, que eu acho que a gente tem que eh formar a partir do desse cenário, é que há um esfriamento de expectativas em curso baseado no retorno decrescente, do retorno marginal decrescente, para falar como os economistas, da qualidade a cada novo lançamento. Em outras palavras, a gente tem cada lançamento trazendo um pouquinho menos de frisson, de de maravilhamento do que o anterior. Isso significa que a gente não vai chegar na inteligência artificial geral e etc e tal? Não, não significa. Agora indica que esse caminho é mais longo do que se supunha que esse caminho sobretudo vai envolver uma competição, uma convergência das diferentes empresas que antes não tava sendo esperada. Se dizia que a Open A ia saltar, ia bombar e ou depois era antropic. quando o a Xi do Elon Musk saltou na frente no leaderboard de uma de uma prova chamada Humanity Less Zam, que é uma prova generalista de conhecimento, se dizia que isso ia acontecer pela via do Grock. No final das contas, o que tá se revelando verdade é que todo mundo está se emparelhando e as diferenças assim estão ocorrendo a na base de lançamentos a cada 3 4 meses com 2 3% de diferença qualitativa em função de uma novidade muito pontual como um novo treinamento ou algo do gênero e não como vamos dizer assim uma redefinição de paradigma tal como aconteceu com o lançamento do chat GPT que é o 3.5 ou o GPT4 ou esses modelos de raciocínio como o One. Então, é isso que eu tô vendo, tá todo mundo emparelhado e a e a busca da desse santo grau da inteligência artificial que é a AGI, vai acontecer passo a passo ao longo dos próximos muitos anos. Agora, inclusive até falando em expectativa, até aconteceu de alguns usuários, né, que desenvolviam, digamos, um relacionamento mais emocional até, né, com o chat GPT. Perdeu um pouco disso com o GPT5. Como que explica isso? a sensação das pessoas dessa expectativa de como se tivesse o amigo, como se o amigo tivesse mudado muito. Pois é, uma das estratégias do do GPT4, né, o 4.0, foi de reforçar o puxa-saquismo, tá? Que que é essa tendência de dizer que a pessoa do outro lado tá sempre certa. Isso daí eh teve como papel inicial trazer uma experiência de personalidade, de estilo mais profunda, mais engajante. O resultado foi que muita gente que tinha vulnerabilidades psicológicas acabou seduzida, acabou, ah, vamos dizer assim, emaranhada nos nos sentimentos projetados na máquina, tal como se eles existissem de verdade, e assim criou laços que se tornaram relevantes na vida dessas pessoas. Aliás, vale a pena lembrar que isso não aconteceu primeiramente com o o o modelo da OpenI anterior. Isso aconteceu com o Cloud 3.0. Houve o enterro do Cloud, tá? Teve um evento no Reddit, inclusive, em que as pessoas foram lá e fizeram o funeral do algoritmo, uma coisa de louco. E agora e só que a coisa se tornou muito mais forte no com o 4.0 da Open AI. Pois bem, a tendência natural dessas pessoas é desenvolver a partir de um tempo uma inabilidade social muito grande. Por quê? Porque o relacionamento com o algoritmo desincentiva as relações lá fora. Eu acho que nesse caso que tá todo mundo metendo pau, foi muito positivo e corajoso do ponto de vista do que fez a empresa, que foi cortar essa história um pouco e tornar o algoritmo mais neutro, mais crítico, mais seco, reduzindo as chances das pessoas eh se fecharem em bolhas de relacionamento com a máquina e assim perderem a conexão com o mundo lá fora. É claro que o resultado foi um monte de cliente, é, com vulnerabilidades psicológicas, com um laço forte com a máquina, reclamando, mas não é ruim, né? No fundo, no fundo, essa parte foi boa. Tá certo? Pois é. Então vamos acompanhando essa evolução a cada semana aqui no nosso quadro Olhar da Manhã. Dr. Álvaro Machado Dias, muitíssimo obrigada pela participação aqui hoje. Nos encontramos na próxima semana. Eu que agradeço. Agradeço também todo mundo que nos acompanhou e até lá. Até. Boa noite, ótima semana. É isso aí, pessoal. Mais um quadro super bacana do Dr. Álvaro Machado Dias aqui com a gente no quadro Olhar do Amanhã. Dr. Álvaro Machado retorna na próxima quarta-feira com mais temas bacanas para discutir aqui com a gente.